TÁ DOIDO?
- paulochedid
- 18 de dez. de 2018
- 2 min de leitura

Ariano Suassuna contava bons casos de doidos. Manoel Bento era um daqueles, um doido de estimação. Certa vez, estava o Manoel de orelha colada em um muro que lá havia. Tão quietinho que outro passante também resolveu colar sua orelha ao muro. E assim foi. Mais outro e outro. Sol a pino e aquele povo prestando atenção em absoluto silêncio e respeito, até que um dos ouvintes chamou a atenção: “Gente! Não estou ouvindo nada.” Da outra ponta, Manoel Bento retrucou:
“Pois é. Tá assim desde de manhã.”
Finado Ariano contaria melhor. Vá até o Youtube, digite Ariano, ele logo vem e conta prá você.
Mas, Ariano estava cheio de razão. Todo lugar tem um doido, um bêbado, tipos cheios de histórias.
Em Franca era um pouco diferente. No asilo havia muitos doidos. Dizia-se que a Mogiana os trazia e largava em Franca, no fim da linha.
“Seo Toinzim”, descalço, calças de brim impecavelmente arregaçadas até as canelas, camisa de algodão bem passado, puxava pelos varais um carrinho vazio de duas rodas que chiavam para anunciar a passagem. E a criançada gritava: “dá um pulinho, seo Toinzim!” Seo Toinzim aprumava o peito, respondia “já vai” e dava seus pulos.
O mais famoso era o Geraldo Pelotão, que odiava ser Pelotão. As pessoas comentavam que era filho de boa família, mas que não deu certo. Sempre de paletó, trazia pedras nos bolsos, sua munição para reagir à molecada. Nunca entendi por quê Pelotão. Também nunca pedi explicações. Geraldo ficava bravo, corria atrás dos meninos, atirava pedras com péssima pontaria, felizmente. Não imagino o que foi feito dele. Nos últimos tempos estava envelhecido, abatido, já não corria e ninguém mais gritava Pelotão.
Afinal, o que quer dizer doido, louco? Deve ser um sujeito que vê diferente. Ariano Suassuna justifica sua admiração e carinho pelos loucos: “Eles enxergam a verdade atrás das aparências.”
Há ocasiões que recomendam ver diferente. Na década de 70, criei uma agência de publicidade. Na porta de entrada, em arco, estava gravado: “Não é obrigatório ser louco, mas ajuda.”
Como ia dizendo, o Asilo de Franca ficava encravado entre o Cemitério da Saudade e o Estádio Nhô Chico, onde a Francana mandava seus jogos, antes do Lanchão.
Foi então que um doidinho fez praça na porta do cemitério. Por alí ficava, agachado, segurando um martelinho para martelar o próprio pé. O Vadinho passava pela manhã e o doidinho martelando o pé. Voltava à tarde e lá estava aquele suplício. Um flagelo.
- “Escuta aqui. Eu passo prá lá e você martelando o pé. Passo prá cá e você martelando o pé. Diz uma coisa: Não dói?
- “Olha moço, doer dói. Mas a hora que eu paro é um alííívio”!
Paulo Chedid
21 de novembro de 2018
Comments